04⠀⠀PÓS-VERDADE, VISÃO E DEEPFAKE

O que o deepfake, as fake news e você tem em comum? Que todos vivem no século XXI e são produtos de seu tempo. O que chamas de zeitgeist é muito mais do que só uma atuação do inconsciente coletivo: ele se espalha como a raiz de uma planta em vários assuntos diferentes, mas todos levando para a mesma árvore: o conceito da verdade não existe.

Ok, deixando essa linguagem comercial, jornalística e chamativa de lado, vamos a um texto mais pedagógico e calmo. No post anterior eu te falei sobre o que é esse termo "deepfake" e como ele pode afetar as nossas percepções. No entanto, hoje, eu quero falar mais sobre isso e dar um olhar mais filosófico e psicológico sobre como tudo isso afeta a percepção humana de maneira absurdamente profunda.

Você já se pegou pensando "Meu Deus, como pode ter tantas pessoas achando que a terra é plana?!". Ou algo como "Minha nossa, mas é sério que as pessoas estão se organizando em grupos anti-vacina?!". Pois bem, isso tudo é muito verdadeiro e sintomático do nosso tempo; não só porque as pessoas estão cada vez mais carentes e a necessidade humana de ser inserido num grupo incentiva a nossa suspensão de descrença até o ponto de negarmos fatos muito bem estabelecidos na ciência: a Terra é plana sim, e as vacinas são a melhor tecnologia da saúde inventada até hoje!

Felipe Castanhari (Canal Nostalgia), discutindo sobre terraplanismo com Leon (Coisa De Nerd) e Nilce (Cadê a chave?")

No entanto, perceba como isso se relacionada com o zeitgeist do nosso tempo. Mas antes, você deve estar pensando: o que raios é zeitgeist?!

Zeitgeist é um termo alemão cuja tradução significa espírito da época ou sinal dos tempos, mas, em uma tradução mais apurada: espírito do tempo. O Zeitgeist significa, em suma, o conjunto do clima intelectual, sociológico e cultural de uma pequena região até a abrangência do mundo todo em uma certa época da história, ou as características genéricas de um determinado período de tempo.
– Trecho retirado do Wikipedia 

O nosso zeitgeist é de perceber que existe uma verdade para cada um que a puder defendê-la. Ou seja, no limite desse pensamento, percebemos que o conceito de verdade não tem consigo abarcar o que percebemos hoje em dia. Por isso, damos lugar à palavra-conceito do ano de 2016 escolhida pelo dicionário Oxford: pós-verdade.

Luis Mauro Sá Martinho falando sobre fake news e pós-verdade.

Como vemos no vídeo acima, fake news é um assunto muito mais complexo do que pensamos. A pós-verdade confirma esse viés do interlocutor em propagar somente aquilo que entra em concordância com o que ele acredita. E, assim, o conceito de verdade vai para o beleléu.

Perceba o quanto disso também não é visto dentro do conceito de deepfake: a partir do momento que os vídeos gerados por essa tecnologia forem tão perfeitos que são indistinguíveis da realidade, não saberemos mais o que é realidade compartilhada e o que é realidade gerada por computação.

Felizmente, hoje em dia o aplicativo que melhor utiliza essa técnica é o REFACE – como abordei com detalhes no post anterior – e ainda é possível perceber que é algo feito por computador. Quer ver como fica?! Vou colocar abaixo a junção de 4 vídeos que fiz utilizando esse app, um com cada diva pop: Luisa Sonza, Pabllo Vittar, Gretchen e a Inês Brasil, respectivamente.

Vídeos deepfake meus feitos pelo aplicativo Reface

O deepfake coloca em cheque tudo o que nós entendemos enquanto visão. Ele nos coloca para pensar se o que estamos vendo é real ou editado para que parece como tal. Existem diversas implicações do uso dessa tecnologia que já podem ser vistas no mundo real para além de um entretenimento vazio, como foi o caso da Nancy Pelosi, cujo vídeo-alterado foi divulgado como sendo o vídeo real. As alterações do vídeo passam desde diminuir a velocidade da sua fala para parecer bêbada, até acrescentar palavrões no seu discurso.

Por fim, quero destacar que não possuo um olhar ingênuo para essa tecnologia, afinal eu entendo as diversas ideologias e questionamentos arraigados juntos à ela. No entanto, acho interessante pontuar que tudo tem dois lados e que a vida é um grande paradoxo, mas que não precisamos fazer disso um dilema. A gente pode sim discutir e problematizar o deepfake, mas também se divertir vendo a cara desse autor que vos fala, Lucas, replicada no clipe da Luisa Sonza. Por que não?!

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